Impacto econômico das decisões judiciais é tema do Congresso da ABDE

Pesquisa apresentada no evento mostrou a ineficiência do Judiciário. Evento também abordou a resistência da Justiça do Trabalho em seguir os precedentes vinculantes do Supremo

O XVII Congresso Anual da Associação Brasileira de Direito e Economia (ABDE) debateu o impacto das decisões do Judiciário no setor econômico. Realizado na última quarta-feira (30.out.2024), no Tribunal de Contas da Paraíba (TCE-PB), em João Pessoa, o painel também abordou a questão da terceirização e a resistência da Justiça do Trabalho em respeitar os precedentes vinculantes do Supremo Tribunal Federal (STF).

Autora do livro O Judiciário Brasileiro: uma análise empírica e econômica, a economista Luciana Yeung apresentou dados sobre o sistema de Justiça. No fim de 2022, os tribunais contavam com 81,4 milhões de processos, uma taxa de mais de 40 mil processos para cada 100 mil habitantes no Brasil – três vezes o registrado na Alemanha (12.320) e quase sete vezes o índice dos Estados Unidos (5.806).

Já o orçamento do Judiciário chega a 1,5% do Produto Interno Bruto brasileiro, muito acima de Israel (0,9% do PIB), que lidera entre os países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). “A Justiça brasileira é mais cara do que em outros países. Além disso, é ineficiente em termos de celeridade e produtividade”, afirmou.

A professora de Direito e Economia do Insper também revelou que quem acessa o Judiciário não são as pessoas mais pobres do país, os chamados vulneráveis ou hipossuficientes. Segundo ela, isso se deve, em parte, pela falta de critério na concessão da gratuidade de Justiça. 

Uma pesquisa do Conselho Nacional de Justiça de 2023 mostrou que mais de 35% dos litigantes que solicitaram assistência judiciária gratuita têm renda de R$ 11 mil ou mais, ou seja, dez vezes acima do salário-mínimo. “No início do processo, o magistrado precisa deferir o pedido. Será que estão levando a sério a questão de quem deveria ou não deveria receber o benefício?”, questionou.

Luciana disse que essa falta de critério causa mais congestionamento no Judiciário. “A ineficiência judicial, obviamente, impacta mais as pessoas mais pobres. Então, aumentar a concessão da gratuidade gera maior lentidão. Isso dificulta o acesso aos hipossuficientes, aos vulneráveis.”

Ela mostrou que a duração média do início do processo até ter um primeiro julgamento no Brasil era de 900 dias em 2024. “Isso é um escândalo. Não está melhorando”, salientou.

O assessor especial da Presidência do STF, Guilherme Resende, destacou a evolução da análise econômica do Direito no Supremo. Segundo ele, a construção institucional dessa nova assessoria no Supremo é mais um passo no sentido de trazer a discussão econômica para as decisões judiciais, avaliando o impacto na economia por meio dos cálculos de repercussão. O objetivo é apresentar diversos cenários, com prós e contras, para que os ministros possam decidir com uma base maior de informações.

Já a terceirização foi o tema abordado por Marcelo Mazzola, professor de processo civil da Escola de Magistratura do Estado do Rio de Janeiro. Ele ressaltou a importância dos precedentes do STF para garantir a segurança jurídica e a previsibilidade, fatores essenciais para a atração de investimentos. “A gente tem a ADPF 324, a Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 26, ADC 48, ADI 3961, a ADI 562 e temas de repercussão geral 550, 725. Em todos, o Supremo diz que é possível terceirizar, que é possível criar novas formas de organização e divisão de trabalho.”

Segundo ele, a Justiça do Trabalho vem descumprindo esses precedentes de forma deliberada, resultando no aumento das Reclamações Constitucionais ao STF. “Mais da metade das reclamações no Supremo são oriundas de casos da Justiça do Trabalho. Então, a Justiça do Trabalho, com as suas decisões, está inundando o STF com reclamações daqueles que se sentem prejudicados ou daqueles que reconhecem que houve uma violação de um precedente vinculante.”

Essa situação cria instabilidade no sistema jurídico, na visão de Mazzola. Além disso, gera custos elevados e desincentivos econômicos, prejudicando tanto trabalhadores quanto empregadores.

O professor lembrou que a Lei de Franquias prevê que não há vínculo trabalhista entre franqueado e franqueadora. Também destacou a hipersuficiência econômica dos franqueados. “Para fazer parte de uma franquia, a pessoa tem que pagar uma taxa inicial de R$ 200 mil, R$ 300 mil e até R$ 400 mil. São pessoas preparadas que fazem essa opção.”

Mazzola ressaltou, ainda, que o contrato de franquia tem natureza comercial e empresarial. Por isso, a competência para analisar uma suposta ilegalidade no contrato é da Justiça comum. “A Justiça trabalhista não pode invadir a competência da Justiça comum, que tem a competência primária para analisar qualquer alegação de fraude”, completou.

Mediado pelo professor Luciano Timm, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), o painel contou, ainda, com a participação do professor Armando Castelar, também da FGV.