Inclusão do esporte no vale-cultura divide a opinião de debatedores na CE

A inclusão de eventos esportivos entre as atividades financiadas pelo vale-cultura dividiu a opinião de debatedores que participaram nesta quinta-feira (20) de uma audiência pública da Comissão de Educação do Senado (CE)(foto). O debate teve como tema o PL 5.979/2019, projeto de lei que amplia o alcance do benefício pago pelas empresas aos trabalhadores — e que está em análise na CE. A reunião foi presidida pelo senador Carlos Portinho (PL-RJ), relator da matéria nesse colegiado.

O vale-cultura foi criado em 2012. O voucher de R$ 50 mensais pode ser concedido a trabalhadores com vínculo empregatício que recebem até cinco salários mínimos por mês. Até 2017, as empresas podiam descontar do imposto de renda o valor aplicado no vale-cultura. Mas esse incentivo fiscal foi suspenso no ano seguinte.

O presidente da Autoridade Pública de Governança do Futebol do Ministério do Esporte, Washington Stecanela Cerqueira, defendeu a aprovação do PL 5.979/2019.

— Não há como assegurar o pleno exercício dos direitos à cultura sem incluir o acesso aos eventos esportivos. Por incentivar a vida cultural dos trabalhadores, o vale-cultura transforma o sentido do labor, o que demonstra a efetiva importância da proposta. Esporte e cultura são as duas principais ferramentas de inclusão e transformação social. Principalmente nas periferias — disse.

A advogada Nathalia Pedrosa, da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), manifestou “total apoio ao projeto”.

— O futebol é uma expressão cultural. Esporte e cultura se comunicam perfeitamente porque são lazer e também são formações socioculturais. O esporte e a cultura partem da formação do cidadão e da cidadania. Um cidadão envolvido no esporte se desenvolve em ética e saúde. É um dever do Estado fomentar esse tipo de iniciativa — afirmou.

Resistência
O PL 5.979/2019 encontrou resistência entre os debatedores ligados ao setor cultural. Para Deryk Vieira Santana, da Secretaria de Economia Criativa e Fomento Cultural do Ministério da Cultura, a mudança poderia comprometer o orçamento da pasta.

— Cada ministério tem um valor de renúncia fiscal previsto. Se a gente aprova isso, o incentivo ao esporte estaria dentro da renúncia fiscal prevista para o Ministério da Cultura. Teríamos dificuldade de diferenciar essa utilização. Se a pessoa for ver um jogo no estádio, como isso vai ser debitado? Como vamos alocar essa isenção fiscal? — questionou.

O advogado Felipe Legrazie Ezabella, presidente da Comissão de Direito Desportivo da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em São Paulo, apoia a criação de um voucher para o esporte. Mas defende uma regulamentação específica para a matéria, separada da legislação sobre a cultura.

— Esporte e cultura caminham lado a lado. Mas talvez fosse de melhor técnica que os eventos esportivos estivessem em um projeto separado. Ou que houvesse um capítulo separado tratando dos eventos esportivos, e não apenas um inciso incluído. Talvez, em um projeto que trate da volta dos incentivos fiscais para o vale-cultura, possa haver uma regulamentação mais específica relacionada ao esporte — sugeriu.

Para o senador Carlos Portinho, a inclusão do esporte no vale-cultura se justifica porque as duas áreas estão sob “o mesmo do guarda-chuva do entretenimento e do lazer”. Na opinião do parlamentar, o tratamento unificado de esporte e cultura fortalece os dois setores.

— A gente está somando, não está dividindo. A empresa vai dar o vale-cultura, mas não vai direcionar aonde o trabalhador vai gastar. A decisão fica na mão do beneficiário. Ele é quem vai decidir se vai usar [o vale] na peça de teatro ou num evento esportivo. Se a gente separasse, estaria criando uma concorrência entre os instrumentos de promoção de entretenimento. Isso seria ruim. A empresa ia falar: “Eu quero que meu empregado veja Flamengo e Botafogo e vá ao Maracanã todo mês”. Aí, ele deixa de consumir a cultura — argumentou.

Carlos Portinho apresentou relatório favorável ao PL 5.979/2019 em agosto do ano passado. Além dele, o presidente da CE, senador Flávio Arns (PSB-PR), e a senadora Teresa Leitão (PT-PE) propuseram requerimentos para a realização dessa audiência pública.